sem foto
e sem palavras e sem planos e sem pressa e sem silencio e sem sono e sem mais sentidos para sentir. encheu-me os olhos, os dedos, o nariz, a boca, os ouvidos. encheu-me o espaço de quietude e vontade e de coisas perigosas. encheu-me de mais vontade de ficar e mais vontade de ir. encheu-me de passado e de futuro e de histórias de nomes e de coisas tristes, de um sorriso luminoso e uma voz cavernosa demais para um corpo magro e macio que dormia como se abraçasse a morte. como se atravessasse o tempo com um punhal. encheu-me de uma eloquencia simples e de algo longe e de algo perto. e enquanto dormia eu revia-lhe o corpo a cada centimetro de imobilidade. e lembrei-me de estar comovida, como uma longa despedida desde o longo olá.
lembro-me dele encostado ao canto branco da minha cama abraçado à minha única almofada, os piercings e as tatuagens e o brilho nos olhos de todas as perdas e todas as conquistas, de todas as vaidades e de todas as inseguranças. lembro-me dele por este cheiro que persiste no quarto por dentro do fumo de muitos cigarros. e sinto a pequenez do meu universo comparado com esta presença. e sinto a pequenez da minha noite comparada com esta ausência.