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sigNature
domingo, fevereiro 29, 2004
 
A net tem destas coisas. Passo a transcrever uma tradução de um texto de um senhor chamado Ken Fanning (www.whygodwhy.com)que aconselho vivamente a quem tiver maleabilidade com o inglês (a língua)

A rapariga que compreendia o que tu não conseguias
Lembrem a miúda, à porta de sua casa. Ela manuseava algo invisível: havia um mapa, um conjunto de personagens, cenários exóticos e intrigas complexas, tudo isto só fazendo sentido para ela.
Ela era uma rapariga à luz do sol, saltitando em sapatilhas, parando subitamente junto à caixa do correio para juntar as mãos em concha num murmúrio. Então ela olhou para cima para ver qualquer coisa no céu, e quando viu aquilo que procurava, correu para um dos lados da casa e começou a gritar palavras que tu não entenderias por entre a música vinda do rádio do teu carro.
A música de repente parecia irrelevante, e não apenas para este momento, mas para este dia, para a tua vida até aqui.
Ela ia andando pela dianteira da casa e com cada passo a sua boca moldava a forma de uma palavra diferente. As suas palavras e passos eram cuidadosamente escolhidos, quase ordenados.
Havia mais que era suposto lembrares-te, não havia? Certamente não apenas estas frases acerca de uma menina a brincar de faz-de-conta no espaço entre a casa e a rua. Algo acerca da razão pela qual a tua escrita anda tão pobrezinha ultimamente.
Ela olhou para trás de si, depois correu pelo pátio para a mata. Parou mesmo junto à linha das árvores, depois voltou-se para acenar, movimentando tudo atrás de si.
Às vezes há uma menina a acenar, e às vezes há uma menina fazendo sinais a um exército de criaturas que nunca conseguirás imaginar.
 
 
Estou sem telemóvel. Por alguma razão perdi-o ontem naquela festa esventrada. Hoje fumo mais tabaco turco enquanto me desmancho aos poucos. Amanhã outra localização geográfica. Banho de metropole.
Já posso dizer "perdi": a história modifica-se. O mundo é blargh, meus amigos.
 
 
Priceless

heartless brighness boneless darkness spineless
loveliness loveliless lovelilies
fondness pondless bondless
fearless sadness

(scissors paper rock)
 
sexta-feira, fevereiro 27, 2004
 
a bala foi disparada
já sei o que me escondiam
mas isto nao parou por aqui: espero cenas do episodio seguinte;
estou algo anestesiada por uma outra droga qualquer mas as pontas dos dedos já sangram um bocadinho: esta cicatriz não ficará muito bonita mas estas eram as regras do jogo. jogo até ao fim. acho que acabou agora, ou acabará com a verdade. sorrirei apenas. e direi "ganhei" com as mãos nos bolsos.

 
quinta-feira, fevereiro 26, 2004
 
Passover

Esta palavra refere-se à quaresma. Na tradição católica encara-se como um periodo de reflexão e expiação. Não tenho nada para expiar nem me junto aos católicos. Mas quarenta dias para reflectir enlouquece qualquer um... We will pass over that:

a) conheço uma pessoa que tem muito medo; rodeia-se de tudo quanto é belo e feio mas não consegue ver, desesperadamente; arregaça as mangas e faz coisas que quer como saidas de dentro mas não me parece que se sinta; procura tudo ao mesmo tempo; ao concentrar tudo em si, despoticamente, o mundo acaba por fugir por entre os dedos, como um sabonete; promete e ameaça de olhos vendados; dispara a torto e a direito como se tivesse de facto uma arma; no tambor resta uma única bala;

b) deixo para trás uma pessoa que não quero deixar para trás; sinto-me vazia se desistir de a trazer comigo; se a carregar aos ombros pesa-me e não consigo andar; se a trouxer ao colo, amarra-me os braços; se a trouxer na memória, desfoca-me o presente; se a puser junto ao peito, quente, amargo e endureço, pois destruirá o que resta de pureza; deixo-a para trás e fico com uma cicatriz, bela.

c) procuro não estragar tudo; a precipitação das palavras; o tudo ou nada dos meus fanatismos de sempre; como se as horas do dia não nos bastassem para as palavras todas que deixamos sempre a meio; hoje sei que ainda coro;

d) sei que há algo que me escondem; sei que vou descobrir, nem que isso me desfaça para além do reconhecimento;há algo na verdade, simples que seja, que faz com que me oriente muito bem no escuro; uso as pontas dos dedos;
 
quarta-feira, fevereiro 25, 2004
 
Carnaval ou a arte de esticar a corda


O tempo passa e tento dominar a arte de não sentir, ou de mentir com quantos dentes tenho. O tempo passa e não o sei usar. O tempo passa mas moi. O tempo passa e não resolve nada. O tempo passa e fico velha. O tempo passa e os prazos vão apertando. O tempo passa e não damos por ele. O tempo passa e não lhe damos valor. Os cães ladram mas o tempo passa. 24 x 7. 28 x 365.
O tempo passa e erro. O tempo passa e ainda amo. O tempo passa a 150 km por hora. O tempo trespassa a roupa até ao osso. O tempo é frio quando se espera e quente quando se espera em vão. É frio e é quente. E sei. E sei bem.
O tempo passa e nós somos escravos. O tempo passa e não passa nas águas do mesmo rio.
 
segunda-feira, fevereiro 23, 2004
 
Apocalypsucks

there was light before my foot got caught in the seventh seal
there was a machine with/in the brain at the last trumpet
the angel tapped:

there were movie critics before the apocalypse
there were dirty words
and money and plastik surgery
and lame escuses
and beautiful funerals
there were blue whales, blue jeans, blue suede shoes
and red threats, alerts, necks, skins and hairs as well as
white doves, white lies and white supremacists
there were mister and master cards
and missiles

i never said "cut"
i never said "aleluia"
i never said "boom"

terrible
you lost
 
 
(DELIGHT) antes da manhã

Um ponto duas frases
duas fases sete horas e no pensar
assim desconto e descoberta e descalçando
os olhos, desfazendo as mãos, desmaiando os poderes sonoros de uma sombra
continuamente à frente
e queria queria queria a razão para hoje
a canção para hoje odiar para hoje
o vento e uma doença apagada
e a imensa comichão dentro desmente
os nós nos dedos riscando a parede
para desatar a língua
a língua a língua sugere
um mergulho para hoje uma pólvora para hoje uma gota de ácido
para hoje.
 
sexta-feira, fevereiro 20, 2004
 
Os protagonistas dos romances de Gibson têm uma íntima e poderosa relação com o ciberespaço enquanto entidade, um chamamento e uma dependência que ilustram a completude erótica, passando este processo pelo intenso envolvimento físico, metafísico e inclusive religioso, deixando a “prisão” do corpo para privar com a estrutura supra-corpórea. Evocando Platão, Heim desenvolve o conceito “erótico”: EROS é o impulso, a ânsia e a inspiração para se ultrapassar o mundo das Aparências, limitado pela fronteira corpórea, para encontrar o mundo das Essências, das Ideias. O ciberespaço enquanto entidade independente de uma estrutura física, onde a informação (as ideias) “flutua” é esse mundo, o do LOGOS. Segundo Platão, só pelo processamento lógico (matemático, diremos) ascendemos a esse mundo perfeito. Contudo, e Heim sublinha esse aspecto, o ciberespaço, hoje, engloba também todos os aspectos das Aparências, das imperfeições. Todas as realidades, toda a Realidade é transformada em informação, até a existência humana: “The ultimate revenge of the information system comes when the system absorbs the very identity of the human personality, absorbing the opacity of the body, grinding the meat into information”. A fronteira primária da individualidade, o corpo físico, passa a ser parte do sistema enquanto zeros e uns.
"the Erotic Ontology of Cyberspace", de Michael Heim, excerto de uma comunicação por C.P.
 
quinta-feira, fevereiro 19, 2004
 
Para a posteridade: ja estou melhorzinha (thanks for asking); xarope, pastilhas, brandymel, comida chinesa, mimos dos amigos e tal, a coisa compoe-se; se não fumasse tanto compunha-se mais depressa, mas aí...

Falhas de/na comunicação
Queria escrever alguma coisa sobre a mestria do falhanço, mas não sei por onde começar. Se faço merda e não me apercebo, digam-me, se fazem merda e se apercebem, assumam. É por aqui...às vezes faltam-me códigos para comunicar. Odeio pessoas que tambem pedem desculpas por tudo e por nada, como se existirem fosse uma maçada muito grande para toda a gente. Só soube o que era isso aos 14 anos. It came as a shock. Nunca se usou essa palavra "desculpa" lá em casa, ao contrário de alguns palavrões. Não a consigo colocar na boca dos meus pais nem nunca a ouvi do meu irmão. Daquelas coisas que, tal como a educação sexual, se vai buscar à escola, entre os amigas, e os amigos (que foi um ainda hoje amigo meu que me explicou tudo acerca do benfica jogar em casa todos os meses, numa aula de ciencias no quinto ano--ele era aquilo que hoje é um geek, delegado de turma e tudo, que depois veio a tornar-se um belo e educado freak, guitarrista numa banda grunge, e hoje psicólogo, trabalhando com crianças em risco). Talvez lá em casa se cultive até hoje o orgulho. Já lá não vivo há 10 anos. Mas aprendi no nono ano e uso-a com juizo. Há coisas indesculpáveis. Uma desculpa não apaga os acontecimentos. Não se pede, evita-se. blablabla. Merda para isso: sou humana. Há de facto coisas indesculpaveis, e nem sempre são dos outros; uma desculpa é apenas o julgamento, uma reflexão posterior dos acontecimentos e revela alguma auto-critica; muitas vezes sem querer, pimba! já se fez/disse uma coisa qualquer que magoou/prejudicou alguem. Demonstra arrependimento. Consciência de falibilidade. Podemos avançar para o próximo nível. É mais ou menos isto que queria dizer. Os gigantes muitas vezes não passam de moinhos. Há coisas que gostava de dizer a algumas pessoas e não tenho palavras justas ou injustas. Sou uma poeta da treta no mundo real. Tento faze-lo pelos gestos atrapalhados, pelas portas travessas, pelo bater impaciente do pé, pelas horas esperadas, pela retirada estratégica, pela exigência nula (se calhar foi assim que sempre se fez lá em casa), pelos desafios que lanço e não recuso, por aqui, por ali, por aí...
 
segunda-feira, fevereiro 16, 2004
 
Estou doente. Sem metáforas de jeito, tusso, doi-me a barriga e o peito de tossir, os olhos inchados das lágrimas que me vêm aos olhos quando tusso. Não dormi deitada, senão tossia ainda mais. doi-me o pescoço e as costas de dormir quase sentada. Não sei se os vizinhos dormiram por causa da minha tosse. Passei ontem quase todo o dia na cama e hoje também, mas tenho que sair. Deixo as janelas abertas para a doença sair, ou deixo-as fechadas para não apanhar frio? A minha humanidade às vezes irrita-me, o meu orgulho também, porque não tenho ninguem para tomar conta de mim e recuso reconhecer que preciso disso. Sou apenas uma criança quando estou doente: mimos, histórias, remédios amargos, chá e mel. Sou adulta e estou só: tenho que me vestir, agasalhar-me bem para ir à farmacia comprar qualquer coisa para isto, limpar as escadas do prédio, não faltar a 50 compromissos...
 
sábado, fevereiro 14, 2004
 
(breve espaço):

Chega a hora levada do sol e o corpo treme de pensar que tem duas mãos que querem abrir
Uma boca que se estende no mato uma faca que fica sóbria no escuro enquanto o bafo se mutila na demora.

Não há consequência
Embora tudo leve a crer que a história virá reclamar a fome
E o desejo
Virá reclamar a fome
Isso não se faz sem medos e sem retiros
Assim com esta capacidade de planos e de pele envolta em chocolate

Sem vontade de resistir, sem voz, sem pontas de dedos
Sem cara

Uma boca que não sabe quando abrir e onde tocar
De um lado tão rápido
Sem toque para outro lado tão rápido
Sem peso

O engasgo verdadeiro sem dimensão
Apenas fluido que tem que se reter nos nervos
Apenas estrada de volta na derme branca
Do que se diz por aí nas propostas ponderadas

Deixam de existir as paredes que não foram bem definidas
Sem texto sem dureza
Onde o corpo bate em busca do golo
E toda a força é nenhuma realmente
E não há as marcas desejadas nos braços do dia
Decrescente

Não há linguagem, não há cheiro, não
Há entulho no espaço
Há língua de silêncio elaborado
Como um gosto
Que não acaba

E fins anunciados de vício assim
Sem fronteira que diga identidade
Sem vontades impróprias.

Até ao fim da cidade que se espalha
No olhar dos segredos finitos do único espaço real
mente
inviolável.
 
quarta-feira, fevereiro 11, 2004
 
Preciso de ajuda! Comecei a escrever um conto e encalhei. Não sei para onde ir a partir daqui. Gosto do título e comecei só com isso, sem ter "história"; Não tem nada a ver com drogas nem com vampiros, tem que ter um reves qualquer que não estou a conseguir; estou a tentar fazer isto gender free/neutre...sem dar a entender ser homem ou mulher; Puxem pela vossa imaginação!
Enviem-me sugestões ou mesmo continuações (podemos fazer disto escrita colaborativa) para info_traffic@yahoo.com :

Celeste

O quarto está húmido, as paredes transpiram como se vivas e a sofrer. A meia luz, com as portadas fechadas, nada parece o que é. Aquela febre de novo. È melhor ir buscar gelo. Uma panela, uma vasilha qualquer. Gelo e mais gelo. Já nada mais há no congelador a não ser couvettes e plásticos. Cubos e outras formas de ex-água, pré-agua. Meto lá primeiro as mãos, depois os pulsos. A cara. Abro os olhos: o titanic lá em baixo, mudo. Peixes de luz, medonhos. Apenas o fundo da vasilha, verde ou azul, tanto faz. Visto a t-shirt só depois de a molhar neste ártico.
Procuro à volta os objectos que me salvam do delírio. O telefone. A agenda fechada. A garrafa de água. O relógio. São exactamente duas horas e dez. A televisão não, as fotos não, o espelho não. Evito as molduras com caras. As caras com molduras, o mundo com molduras, as molduras com o mundo. A rotina do não-delírio. Nunca fiz nada com tanta força. Nem abro a cama para não lhe sentir o corpo debaixo do lençol. Não o meu corpo, mas aquela amálgama de corpos que da outra vez (a primeira febre de todas) me queria, como se todos os corpos que pousaram nessa cama se deixassem fragmentar e reconstruir num só. Deito-me em cima da coberta, braços abertos ao lado. Uma das mãos dentro do gelo. Um ex-cubo de gelo dentro da outra mão fechada. Espero.
Passo a língua pelos lábios quentes e inchados. Apetece morder até fazer sangue. Lágrimas nos olhos dilatados. Os sons da rua impedem-me de gritar. Se os ouço também me ouvem. Não me podem julgar na insanidade, não me podem enviar para o hospital, não conseguem compreender que isto tem que ser assim. São exactamente três horas. Conto até cem. Tem que ser assim, tem que ser. Não há outra maneira. As veias tornam-se mais azuis, os olhos mais azuis. Se me olhar a olhar-me, ver-me-ei com o cabelo colado à cara, os dedos fincados na cama. À espera. Penso na melancolia. Algo seguro e vago. Algo que me deixe ficar. São exactamente quatro horas.
 
 
Não sabemos onde estamos. estamos atentos. estamos distraidos. estamos comummente afastados dos mistérios e das misérias. estamos perante lutas e debaixo de fogo e julgamento. estamos na rua às 7 da tarde. estamos bêbedos quando deviamos estar sóbrios, sóbrios quando deviamos estar ébrios para nos forçar à sobriedade. estamos contentes por desconhecer leis básicas. estamos amargos de boca suja. estamos receosos de nos queimar. estamos sós na noite, sós na cama, sós lado a lado nas poças de lama. estamos comunicáveis e mudos. estáveis e absurdos. estamos todos os dias a tentar ver e tentar criar. todos os dias a movermo-nos na sombra. rente à parede. estamos mais valentes que nunca. mais ansiosos que sempre. mais tensos. mais vaidosos. mais medonhos. estamos mais velhos também, mais doentes, mais curiosos, mais estranhamente estranhos. estamos mais lidos e sofridos. conselheiros e elegantes. estamos mais sensiveis ao tacto. mais alheios a mãos alheias. mais fumadores na renúncia. mais trabalhadores sem riso. estamos onde estamos. Na praça, na rua, no largo, no café, na escola, na sala, no escritório, no quarto, de visita ou de passagem, de surpresa ou de armas e bagagens, de partida ou de largada ou de fugida.
 
terça-feira, fevereiro 10, 2004
 
Hoje decidi diversificar: comprei a Wizard e a Scientific American; estou a ouvir Stereolab e a fumar no quarto; fiz um backup e escrevi uns quantos emails; sei que sou uma amiga desnaturada, vencida pela distancia e a desperança;
Saudades: queria ouvir o saxofone da Kim, o ronronar da Lara, o sotaque estranho do Laurent, cheirar o cabelo do João, ouvir os poemas da sandra, os pontapes na playstation do meu irmão; cheirar o nestum do miguel; ouvir "the street where she lives" na voz da Nancy, o djabé do Papa Emile, o chris a dizer "hey baby" à gata; o resmungo da nancy, "as gaivotas no parque" do doug; o"pontapé na pomba" da patricia; a spoken word do Michael; cookies da Jay, cheesecake do Kevin, labatt blue, baby bass ale, Tim Baldwin; yams e fish fry; neve e mais neve e esquilos e mais esquilos, Sherry e os seus feitiços; as cartas e o absinto do hugo, o riso a cidra e as hostias de camarão do carlos ramos, as desculpas do tó mané, a mão do nuno, a bateria do barreto, as caveiras do ricardo, as mãos da teresa, os desenhos da sónia, o kiddush da ana, o riso da débora, a viola do BA, os ovos verdes da D.Ana, a varanda do João; saudades com uma lista enorme a acompanhar a deslembrança e a falta de provas, o papel amarelo e o estragar do fígado, as fotos e as ruas onde nos abraçamos e beijamos, as cadeiras, os sofás, os bancos de jardim, a relva, o parapeito e o degrau
 
 
Este poema é para um amigo recente. (
Queria te-lo mandado no email, mas depois esqueci-me; faço-o público mas é para ti, que já sabes demais).


Não há desculpa para esta pura discórdia sobre a inércia
Sempre numa mão dobrada, a dependência, sempre
Um estalar de dedos e mais um dia.

O pregão que se tem pregado ao texto, à textualidade de uma mesa
À módica posição do abraço.
Quero não mais do que me voltar ao texto para me voltar. quero mais do que a meia volta atrás do novelo. O branco que me fica na pureza do domingo, que me fica na cura. Processo esta concentração para me dar sem meias palavras daquilo que já foi dito. Quero que o som seja claro, que a luz incida de cima. clara como luz.
Quero que esta voz sempre me lembre de um segredo em viagem. Que ninguém saberá mais do que isto. Que sempre não mais do que aquilo que é feito nalgum tipo de solidão. Seja só.

Não há lugar para a distracção e a perda do mesmo tempo de sempre. Vivo-me à hora que é sempre cedo. Espera. E mais deixado no tecido. E mais deixado em algum sítio que é sempre o tecido na volta. Que ninguém saberá mais do que o gosto disto que é azul como o ar. Que o frio se reproduz nas bermas, que o corpo pede o engasgo. Que o corpo pede a barragem.

Não há lugar para a mestria do consumo. Não me deixes volver à estrada. Não me deixes beber o alcatrão de sempre. Não deixes de beber o alcatrão da outra estrada. E não voltes nunca. Não olhes para trás. E mais terás deixado.

O pregão que se tem colado à cobardia. Não haverá mais as mesmas paredes se puder fazer uma noite de insónia para descansar. A rendição.

Deixa. Devolvo.
 
segunda-feira, fevereiro 09, 2004
 
Não podia ter encontrado melhor letra de música. Os brasileiros são mestres na síntese que, como se sabe, é uma das características mais desejadas da poesia. E esta até rima! Há quem diga que sou obcecada por estas questões. Há quem considere estas questões uma obsessão. Há quem não pense nelas e só faça merda. Há quem pense demais e só faça merda na mesma e seja infeliz. Há quem pense e faça e sonhe e se apaixone e perca o sono e fique com o corpo dorido e um sorriso nos lábios e uma lágrima contida e areia no umbigo e o cabelo descomposto e a pele irritada pela barba por fazer e o coração despedaçado e um número de telemóvel e a ansia e a ansia e o espasmo e a espera e a noite e a manhã dentro e o dia dentro e o mundo não chega.
há quem diga muita coisa, e não faça nada.

Amor E Sexo
Rita Lee



Amor é um livro
Sexo é esporte
Sexo é escolha
Amor é sorte

Amor é pensamento, teorema
Amor é novela
Sexo é cinema

Sexo é imaginação, fantasia
Amor é prosa
Sexo é poesia

O amor nos torna patéticos
Sexo é uma selva de epiléticos

Amor é cristão
Sexo é padrão
Amor é latifúndio
Sexo é invasão
Amor é divino
Sexo é animal
Amor é bossa nova
Sexo é carnaval

Amor é para sempre
Sexo também
Sexo é do bom...
Amor é do bem...

Amor sem sexo,
É amizade
Sexo sem amor,
É vontade

Amor é um
Sexo é dois
Sexo antes,
Amor depois

Sexo vem dos outros,
E vai embora
Amor vem de nós,
E demora

Amor é cristão
Sexo é pagão
Amor é latifúndio
Sexo é invasão
Amor é divino
Sexo é animal
Amor é bossa nova
Sexo é carnaval

Amor é isso,
Sexo é aquilo
E coisa e tal...
E tal e coisa...

 
sábado, fevereiro 07, 2004
 
yasal uyari: sagliga zararlidir
isto deve querer dizer que o tabaco mata, em turco. ou que prejudica a saude mais ou menos. o tabaco turco mata, mas soa melhor quando nos dizem isso em letrinhas imperceptiveis num discreto maço de marlboro. Eat this, sr.Phillip Morris!!!!!
 
sexta-feira, fevereiro 06, 2004
 
Moloko "Statues"


So goodnight my dear
Hope you’re feeling well
Hope your’re feeling very clear
In this song and rhyme
Thoughts of changes that
Keep ourselves intact

And yes
It’s hard to fake but I’m faltering
In the steps I’m about to take
I am sure it’s true
What is all for me is much the same to you

If all the statues in the world
Would turn to flesh with teeth of pearl
Would they be kind enough to comfort me
The setting sun is set in stone
And it remains for me alone
To carve my own and set it free

So we wait and see
How this backward chapter reads

In verse inadvertently
And it feels like fading light
But that’s all that’s left
Only what’s left is right

If all the statues in the world
Would turn to flesh with teeth of pearl
Would they be kind enough to comfort me
The setting sun is set in stone
And it remains for me alone
To carve my own and set it free

Jumping from a balloon
A carried aloft by a parachute in June
Twisting round and round
Well I hope the ground is what you find

The setting sun is set in stone
And it remains for me alone
To carve my own and set it free
 
 
(Isto não é normal, os galos cantarem a estas horas. Que é feito das coisas naturais, como chover em fevereiro? E ele, onde anda, quando ja devia estar em casa? E eu porque é que estou em casa se me apetecia ir para a rua? E porque é que o telefone não toca? e amanhã tenho aulas? mãe, porquê?)

...na saude e na doença, até que a morte nos separe...
Ele olhará para mim por cima da secretária cheia de propaganda médica e sorrirá levemente. E eu para ele. apaixonamo-nos e marcaremos encontro para breve. Ele saberá tudo de mim, sonhos e medos. Ele saberá a que horas acordo e me deito. Ele dir-me-á para deixar de beber e fumar. Ele dir-me-á para ir viver para o mundo dele e deixar tudo de meu, o pouco que tenho.Tudo porque me ama e me quer ver bem. terei o seu número no telemovel para ligar a qualquer hora do dia e da noite. Deixará a mulher na cama para me vir salvar. Ele é mais velho e vai tomar conta de mim. Estudou muito e trabalha muito mais para tomar conta de mim.
Construirá uma sala almofadada só para eu não me magoar, para que nada de mal me aconteça. Oferecer-me-á uma camisola nova quatro números acima. Dar-me-á um abraço quente por detrás enquanto me beija o pescoço e diz que me ama. depois faz gentilmente um laço apertado no que sobra das mangas, junto à cintura, como simbolo de tudo o que me prometeu: segurança, protecção, calor. Arranjar-me-á uma casa com muitos empregados que me fazem tudo e vai-me ver regularmente. sempre com aquela voz doce e o mesmo sorriso manso. Dá ordens aos empregados, assina muitos papeis, e promete voltar. Quer ver-me bem e afaga-me o cabelo.
Da janela vejo-o entrar no carro e partir. Inclino-me para lhe dar um beijo ao longe. Caio.
 
quarta-feira, fevereiro 04, 2004
 
Querem que seja mais clara, mais explicita? ok. Tutorial de figuras de estilo: metonimia(a parte pelo todo); metáfora (cruzamento das caracteristicas de dois objectos, latos); flashback (estratégia que consiste em voltar atrás no tempo para esclarecer duvidas que persistam em relação ao presente); jogo (de palavras e de conceitos, porque língua é tudo e não ser fazer basicamente mais nada do que camuflar, codificar, argumentar). Somos advogados, nós os virginianos. Conseguimos convencer o diabo de que ele nao existe. Conseguimos convencer os nossos amantes de que não os amamos. E nunca o contrário.
Se ando nostágica? sim, muito. Se sou cruel? Bastante e com muita discrição, e orgulho-me disso. Se sou capaz de amar? sim, em muitas e variadissimas instancias e demasiado incondicionalmente.(os afectos não são mercantilizaveis) E aceito completamente o mesmo. "If you can't be with the one you love, love the one you're with". A minha paleta de cinzentos espalha-se por aí. Entre a troca de afectos. Uma palavra por sms, uma lente convexa no bolso, uma canção, um desenho, um segredo, um olhar, um toque no setim negro por cima da pele.
Se desejo? sim, e em muitas e variadissimas instancias e demasiado. Não confundo sexo com amor (remeto para a citação acima). Também nunca o faço sem ele. E admito-o, e um amante jamais poderá exigir de mim mais do que isso. Mas muito raramente durmo com um amante. Não há nada mais belo que um homem a dormir.
Se escondo? sim, e em muitas e variadissimas instancias. deixo o conhecimento amadurecer até à fruta para deixar que o sumo me cole os lábios. Ou trinco-a verde, amarga, até que as lágrimas me venham aos olhos para dizer (over and over again) que não sei degustar o doce.
 
domingo, fevereiro 01, 2004
 
Esta cidade não acredita em coincidências. Há poucas coisas em que esta cidade acredita, na sua forma circular, na sua brilhante esfera. o espaço privado torna-se público e o espaço público entra-nos pela janela adentro de qualquer maneira. uma conversa cruzada. tudo o que se faz e o que se contém fazer em breves jornadas clandestinas. quais os espaços ocos? recolho-me a estas ruas e alamedas, trago-as inteiras de olhos fechados e penso em como tudo era dantes, em como eram as mais curtas, em como reconhecia as esquinas iluminadas. recolho-me a estas quatro paredes simetricamente aparentes. recolho-me a esta caixa craniana que não me recolhe do mundo. um quadro flamenco. um quarto flamenco de alegorias de janelas e quadros e janelas dentro de quadros dentro de quartos de janelas.
penso em como tudo era dantes e não era mais simples. em como acordava e os via dormir ao meu lado e ao toque da mão. em como não acordavam ao toque da mão. em como as escadas nos levavam a qualquer lado de cima ou debaixo.em como esperava porque sabia das previsibilidades relativas. em como, ao contrário de agora, nada era combinado e mais lento. havia beijos nesta cidade. a inconsequencia do ser e do sermos inconsequentes. havia sonhos nesta cidade que nos tiravam o apetite e nos transtornavam o dia. havia um grande esquecimento nesta cidade. e eu dormia a ve-los, acordados, a esquecer.
 
 
por mais que custe admitir a toda a gente de coimbra que me vê dançar: Não, NAO ando animada a coca. Nunca lhe toquei. A musica da máquina, a máquina em si, da-me mais do que algumavez algum de vos me poderá dar. There is n such thing as heartless music. esqueçam o deus ex machina, o homem atrás ou dentro da máquina. o que interessa, o que existe, por mais que custe, é a máquina dentro do corpo. o ser máquina. To see truth in the face. Know it for what it is. heart is music. dance.
 

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